O ínsulo

domingo, dezembro 10, 2006

TLEBS - 2

TLEBS, INOVAÇÃO E CATÁFORA
( Continuação da anterior)


Para fazermos uma ideia do espírito que terá presidido à elaboração da tal TLEBS (Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário), atentemos nas palavras ( poderíamos dizer palavrões...) que os Iluminados foram rebuscar (ao grego, é claro), para nomear conceitos que dizem ser novos. Por exemplo, catáfora e que nos dicionários menos recentes é registada como vocábulo da área da Pat. (patologia). Mas antes da catáfora, convém lembrar umas coisas, que não deviam ser nada despiciendas para os fautores da ‘reforma terminológica’.
Lembrei-me de dar uma espreitadela ao que se passa, por exemplo, na vizinha Espanha e na França. E tenho em meu poder com quê: nada menos do que a GRAMMAIRE du français contemporain – Larousse, de 5 cinco professores universitários, edição Larousse-Bordas de 1997; e GRAMÁTICA BÁSICA DEL ESPAÑOL, norma e uso, de Ramon Sarmiento e Aquilino Sanchez, SGEL, 10 ª edição 2001. Pelos vistos uma e outra usam – eu diria à exaustão (a espanhola indica isso na contracapa) – a terminologia oficial usada nas escolas, no ensino da respectiva língua. E que verificamos nós ao folheá-las com um certo vagar? Que em ambas, se mantém, geralmente, a terminologia tradicional, acrescentando, é claro, coisas que têm a ver com as últimas achegas da linguística. Como de resto se tem verificado nas melhores gramáticas de Português, entre as quais não tenho receio de mencionar: Gramática do Português Moderno, de M. José Castro Pinto / Maria do Céu Vieira Lopes, 6ª edição Plátano Fev./2005, gentilmente oferecida pelo autor; Gramática de Português, de Cármen Nunes / al., Didáctica Editora, 3ª edição 1995 (lembram-se da célebre gramática do mocho que ainda foi a que nos valeu, mantendo o equilíbrio, na tal hecatombe generativista?...); Gramática [UNIVERSAL] Língua Portuguesa, de A. Afonso Borregana, Texto Editora, 1996. E, é claro, a NOVA GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS CONTEMPORÂNEO, de Celso Cunha e Lindley Cintra.
Quanto à francesa, lá estão: ‘la proposition’ (que há muitas décadas corresponde à nossa ‘oração’ e não é substituída por ‘la phrase’), ‘les noms (nom substantif, nom adjectif’), les ‘conjonctions’, les ‘adverbes’, les ‘adjectifs qualificatifs’ et les ‘adjectifs déterminatifs’, le ‘nom propre’, ‘propositions subordonnées’ etc., etc.
Quanto à espanhola, à parte um ‘palavrão’ ou outro certamente inovado, como, p. e., chamar ‘prótasis’ à ‘oracion condicional’ e ‘apódosis’ à ‘principal’, na generalidade a terminologia tradicional mantém-se. Mas eu acho que não é de mais pedir aos Iluminados que confrontem as terminologias espanhola e francesa com a que eles nos estão agora a propor/impor. Experimentem só...
Permitam-me voltar aos tais pelo menos 210 palavrões que eles dizem terem entendido ‘inovar’. E agora sim, vamos então à catáfora.. Vejam só.
Fui a todos os dicionários que me rodeiam a mesa de trabalho, para ver se em algum a encontrava registada. (É claro que, vendo-a composta de dois elementos gregos (kata+phora), não era muito difícil encontrar o significado etimológico (que não é o caso na TLEBS!). Em metáfora só muda o prefixo ( a preposição...). Mas... e linguísticamente, o que seria uma catáfora ? Como nenhum dicionário me informava, nem os portugueses, incluindo o Dicionário das Ciências da Linguagem de º Ducrot / T. Todorov, os mais recentes e os antigos, nem os franceses, Larousse (mais antigos e o Petit de 2005), Le Petit ROBRTS (1993)...
É claro que não podia deixar de ir ao dicionário Grego-Português. Tinha de ter. E tinha mesmo. Querem ver?
“kataphorá, ãs: s.f. descida, queda, ferida profunda”.
Para maior descargo de consciência, voltei a dar uma volta aos portugueses e lembrei-me do grande dicionário (7volumes) de J. Pedro Machado que, há mais de 40 anos adquirira como sócio da Sociedade de Língua Portuguesa. E não é que registava mesmo! Mas sem qualquer acepção linguística. Assim:
“Catáfora, s.f. Letargia || primeiro grau do coma || coma imperfeito || Termo com que se designava um estado intermédio ao coma e ao estupor.” .
Para que não me acusem de sectário, fui também ao Dicionario de la Lengua Española, da Academia Real Española (1995). De todos, vejam bem, foi o único em que encontrei a palavra registada com indicação de que se trata de termo linguístico: “tipo de deixis que cumplen ciertas palabras, para anticipar por una parte aún non enunciada del discurso, que va a ser emitida a continuacion, v. gr, esto en la frase lo que digo es ESTO: que renunciaba.
Só que, tal não chegou para me convencer de que a TLEBS é boa.. E mais digo, não querendo ser profeta de desgraça: A TLEBS pode ser mais uma desgraça para o ensino/aprendizagem do Português!.