O ínsulo

domingo, dezembro 31, 2006

NATAL / 2001

n a t a l / 2 0 0 1


As ruas e as máscaras acendem-se de luzes
mais uma vez o que não é parece
todos felizes em busca da alegria
por cima do sofrimento universal do Mundo
e os bombardeios continuam “Deus o quer!”
destruindo cidades destruindo aldeias
matando inocentes que já não vão morrer à fome.

Deus e Alá (que bela companhia
assistindo ao espectáculo por cima das nuvens
impávidos e serenos) abençoam
os que matam e os que são matados.

É Natal o Menino-deus nasceu!
Terminou por este ano o Ramadão!

Deus e Alá como são grandes !
Mas por agora Deus é maior não é?...



Pombal, Natal 2001
António Marques

NATAL / 2000

Natal 2000
(o tal do bimilénio)

(40 anos depois, completamente desenganado
da fé em Deus e quase definitivamente descrente da fé no Homens)


Natal é mentira!
(Como quem descobriu que o Pai-Natal não é!)

É mentira o milénio
como é mentira a história
mumificada
que homens inventaram construída de mitos.

É urgente pegar nessa múmia
e delicadamente (não vá ela acordar!...)
desembrulhá-la
tela a tela elemento a elemento
desde a primordial à novíssima verdade.

A continuarmos assim neste sofisma
em obstinação de premissa falsa
(e agora por aí tão globalizada!)
coitados de nós nunca mais teremos
outro que não seja o Natal que temos:
essa falsa conclusão mitificada.


Pombal, Dezembro/2000 ( dito Segundo Milénio)
António Ínsulo

NATAL / 1959

Mais um Natal

(De um poeta de andar por causa ainda com fé, mas quase desenganada)

Mais um Natal! Mais uma noite fria
de calor divino vai passar por mim...
Mais uma vez direi: ”Eu não sabia
que este gelo e esta neve ardia
e queimava assim!”

Mais uma vez armei o meu presépio
e cantarei...
ao Menino Jesus eu cantarei
lindas canções de amor:
“Porque estais com frio, meu Menino-Rei,
quando Vós sois o Senhor?!”

Mais uma vez...
... e o ar se embalsama de mistério.
E a noite, que de graça e luz se fez,
por fora nossa alma envolve,
e por dentro,
inebriada em sons de encantamento
de místico saltério.

- Mas porquê, Jesus, tu voltas a insistir
com os homens para que se amem,
para que Te amem
na fé em Ti e na tua esperança?!
Há tantos anos que o fazes, e a sorrir,
sempre a sorrir amorosamente
um infinito sorriso de criança! –

Mais uma vez... e o mundo voltará,
nas noites frias que depois virão,
a resfriar e a ressequir,
como se ele em si sentisse já
outra vez
míngua de pão e de sorrir...

Mais uma vez... e outra... e outra mais...
enquanto no mundo houver sinais
de desamor,
o teu Natal, Senhor,
se haverá de repetir...

Natal /1959
António Marques

domingo, dezembro 17, 2006

Contraditórios eixos do mal quadratando o círculo

O Ínsulo ouve/vê, quando calha (porque em boa verdade eles não merecem o nosso respeitoso acolhimento regular) esses programas em que três ou quatro jornalistas, soi-disant comentadores políticos (eu digo: fazedores de opinião), nos querem fazer crer que estão uns contra os outros -“Contraditório”; ou todos contra qualquer coisa - “O Eixo do mal”; ou ainda paradoxando – “A Quadratura do Círculo”. Quem, neles, contradiz quem? A bem dizer, ninguém. Dando à coisa um ar de discussão acirrada, por lá reina, do princípio ao fim, um espantoso unanimismo. Às vezes ainda têm a sua piada, quer dizer, alguma validade (convicção? seriedade? isenção? ) algumas sentenças de Pacheco Pereira...
Para provar o que diz, o Ìnsulo refere-se ao “Contraditório” da última sexta-feira (15/12/06), com Carlos Magno a pontificar, claro, ultrapassando pela direita, imaginem só, o próprio Luís Delgado!. Falavam da Palestina, da guerra civil que está prestes a rebentar...
- Ou já rebentou?- intervém L.D. - Então eles não têm estado sempre em guerra civil?
Fatah para aqui, Hamas para ali, etc. e tal... Dos Anjinhos da Guarda que Jeová pôs ali ao lado para “guardar” a todos – os de cá e os lá da fronteira – nem uma palavra, nem sequer uma vírgula: silêncio absoluto!
Depois, passam à morte de Pinochet. Que isto e mais aquilo... e às tantas vem de lá a boutade: ”Eu perdi todo o respeito que tinha a Salvador Allende quando soube que ele se suicidou”! E sabem vocês da boca de quem? De Carlos Magno, pois! E à boutade, ninguém, no “Contraditório”, contraditou, ficando o ouvinte com a impressão de que, ninguém contraditando, todos estão por... E o Ínsulo vai pensando com os seus botões: mas foi mesmo C.M que a disse? Não terá sido Kissinger?!... E mais pensou: então, se perdeu todo o respeito que tinha por Allende, para quem passou ele todo esse respeito? Se calhar, para Pinochet, de quem continuaram a falar com tanta mansidão, com tanto respeito!... Morreu sem ser julgado? Mais um anjinho para o Limbo...
O Ínsulo achava que estes programas, tão politicamente correctos, não deviam esconder a sua supercorrecção em títulos disfarçados. Deviam ter os títulos que merecem. Por exemplo: “Unanimório”, “O Eixo do Bem”, “ A Circulatura do Quadrado”.

quinta-feira, dezembro 14, 2006

(QUASE) TLEBS - 8

CARTA ABERTA AO DIÁRIO DE NOTÍCIAS

(Esta já é de Outubro, mas convém tê-la sempre presente)
Senhor Director,

Esteve O Ínsulo para escrever ao Director logo no dia em que foi publicada a já célebre NR que tão acertadamente respondeu aos contestários da forma correcta do também já célebre título de primeira página “Um terço dos estudantes já foram vítimas de violência” . Satisfeito com a resposta , a meu ver correctíssima, expressa na tal NR, acabei por dar a questão por arrumada e não cheguei a escrever para dar os parabéns à Direcção do Diário que há muitos anos diariamente leio.
Eis senão quando, hoje (2/Out./ 2006), vem o provedor e estraga tudo! Estragou tudo porque acabou por atirar com a grosseira dúvida para cima da correcta solução da tal NR ! Com base, vejam bem, num sofisma, de resto muito mal elaborado ! É por essas e por outras que eu não vou com a figura de provedor seja do que for. Mesmo assim, atraído pelo título “Singular ou plural”, leio a página do Provedor dos leitores e deparo com o tal sofisma da prof.ª Maria Regina Rocha, consultora da Ciberdúvidas . “(1) Um terço dos estudantes já foi vítima de violência = Há muitos estudantes no País. Um terço já foi vítima de violência (e nunca: Um terço já foram vítimas de violência)”. Veja-se se tem algum jeito este exemplo. Se é de um exemplo assim que se trata!...
Um exemplo que sofismadamente não tem nada a ver com os exemplos dos ilustres gramáticos que defendem a duplicidade de forma de usar o singular ou plural em casos em que a forma do tipo ‘o grosso de’, ‘metade de’, ‘a maior parte de’ terá de ser seguida de determinativo no plural, como aconteceu no título em questão “Um terço dos estudantes já foram (ou já foi) vítima(s) de violência”. E o sofisma está em fazer desaparecer ( pelo sim pelo não...) o plural do partitivo, levando o exemplo até à forma “Um terço já foi vítima (e nunca: Um terço já foram vítimas de violência)”. Nem se entende aquele sinal ‘ = ’ que, em boa verdade, não corresponde a qualquer igualdade, pois de semântica não se trata e, tratando-se de sintaxe, a igualdade não se pode propor, exterminado que foi o complemento (determinativo plural). Alguém acha que há relação de igualdade entre a primeira frase e a segunda, mesmo acrescentada da terceira e da quarta? Todas juntas, podem ser maneira diferente de exprimir a mesma ideia, talvez, mas são frases, no plano da sintaxe, gramaticalmente diferentes . O que fez a autora do sofisma foi manipular o discurso de modo a fazer desaparecer o tal determinativo plural – dos estudantes – até chegar a uma forma que, essa, já não permite a duplicidade!... Para não perder a ideia de plural, deu a volta ao discurso e começou por aí: “Há muitos estudantes no País.” Etc e tal.... Experimentem substituir o título do jornal por todo este discurso que vem depois do sinal ‘ = ’!...
É claro que, transformando a frase, de modo que não tenha lugar o detrminativo do partitivo, no plural, terá de ser singular. Mas repare-se bem : no início do exemplo, o determinativo está lá –“dos estudantes” – está lá tornando legítimo o duplo uso em alternativa (do singular ou do plural). É isto que defendem todos os bons gramáticos e linguistas que há mais de um século nos têm apoiado o ensino do Português, em todas as gramáticas, desde as mais antigas, passando por Adriano Gomes, Nunes de Figueiredo e outros, ou mais recentes Pilar Vasquez Cuesta, Celso Cunha / Lindley Cintra, sem esquecer as gramáticas que estão ainda a ser usadas nas escolas, entre as quais: Gomes Ferreira da Porto Editora, Borregana da Texto, Castro Pinto / al. da Plátano , Cármen Nunes / al. da Didáctica Em suma, todos admitem a legitimidade da dupla forma – singular ou plural - desde que a frase esteja construída com o partitivo plural.
Mas vêm esses e essas linguistas, que se dizem, note-se bem, de gramática descritiva e não normativa, arrogar-se o direito de, não só romper com a norma, de décadas, talvez de séculos, mas também, e ainda por cima, impor (veja-se a contradição sem pés nem cabeça!) a sua norma. Como? De qualquer maneira nem que, para tanto, seja preciso manipular, distorcer, transformar o exemplo em questão, de modo a torná-lo diferente, deformado. Como? Afirmando-se linguistas de gramática descritiva, mas assumindo atitude normativa (da sua norma, claro!). Sim, porque a profª Maria Regina não se apoia em ninguém com indiscutível autoridade linguística e gramatical: é assim porque sim; é a sua opinião e pronto!
Espero bem que qualquer dia não venham esses linguistas descritivos defender que ‘vão haver’ está correcto porque sim ou porque a maior parte dos falantes assim dizem (ou diz)...
Para concluir, continua a cirtaçã0, ipsis verbis, da dita senhora professora. Assim: “(...) Concluindo: ao contrário do que fez o Diário de Notícias (e o Público, já agora...), neste tipo de frases, deve usar-se o singular, que respeita a norma sintáctica, evitando-se a concordância pelo sentido.” “deve” – diz a senhora. Ou seja, decreta a sua opinião “que respeita a norma” , implicitando que a outra forma não respeita; para evitar porquê ?, se a concordância pelo sentido pode respeitar a norma?! ( Veja-se tb “concordância de proximidade”...). E diga-se que a concordância pelo sentido, ou com o sentido, herdou-a a nossa língua da sua mãezinha latina (constructio ad sensum), que, nesse caso, até vai além da nossa norma, admitindo que um nome colectivo pode levar o verbo para o plural, como acontece nos seguintes exemplos: “Multitudo confugiebant” (Cíc., De Off., 2,41, cit. in Compêndio de Gramática Latina, Nunes de Figueiredo / M. Ana Almendra, 6ª ed., p. 141; “Cetera classis fugerunt [ A restante armada fugiu] (Liv , cit in Gramática Latina , António Freire – Public. da Fac. de Filosofia de Braga, 1983, p. 169). É claro, a este uso normativo não chega a ousadia da nossa língua.

Com os melhores cumprimentos
do Ínsulo

quarta-feira, dezembro 13, 2006

TLEBS -7

TLEBS - “A Implosão” ( V.G.M.)


O Ínsulo acaba de ler mais um importante artigo de Vasco Graça Moura (DN 13/Dez/06, p. 8), sobre “o malfadado processo da TLEBS” a que dá o título “A implosão”. Referindo-se, por sua vez, ao artigo “absolutamente devastador, de João Andrade Peres no Expresso de 6-12-2006 [vide site jperes.no.sapo.pt ], e às fortíssimas intervenções de Jorge Morais Barbosa, dizendo que “eles fizeram o que lhes competia: chamaram a atenção para a gravidade do problema” etc. E que “Isto não os livrou de serem apodados de ‘reaccionários’ por uma dama, ela sim, ‘tão progressista’ que só mostrou saber lançar mão do argumento de autoridade em termos acríticos, do tipo ‘façam favor de estar calados porque isto só diz respeito a quem sabe e quem sabe são os linguistas’ Sibi imputet e que o doutoramento a que se candidata lhe pese tão pouco quanto a exígua bagagem de que dá provas. Mas seja-lhe lembrado, recorrendo a uma terminologia galinácea que deve estar ao alcance do seu entendimento, que mesmo quem não seja capaz de pôr ovos pode ter boas razões para achar que um ovo está estragado e é impróprio para consumo”
O Ínsulo pede lhe seja relevada a extensa citação, antes de mais, pelo autor rogando vénia, e depois aos ‘navegantes-deparantes’. Ele acha tão importante o que acima refere Graça Moura [vgm@mail.telepac.pt], que foi isso mesmo que o levou a escrever esta TLEBS – 7.
Então, digam-me, ainda há neste mundo de hoje quem se agarre, antes de mais e depois de tudo, ao argumento magistral como o mais válido argumento para provar seja o que for?!... Se o Ínsulo soubesse inglês, até lhe apetecia dizer: My God ! Ele pensava – pobre Ínsulo! – que nos tempos em que estamos, esse seria sempre o último recurso argumentativo... E quando alguém a ele recorre, é certo e sabido que não tem mais nenhum que ofereça alguma consistência. Então, o autodidactismo não é imprescindível factor de formação/informação, mesmo para um especialista seja de que área for?! Não se lembram do que dizia (ou escreveu?) o nosso Nobel Egas Moniz: “Médico que não sabe senão medicina, nem medicina saberá..” ?!

domingo, dezembro 10, 2006

TLEBS - 6

TLEBS – um abaixo-assinado inadiável




Gente, altamente qualificada na matéria linguística e literária, e nessa qualidade sobejamente conhecida, em boa hora lançou um abaixo-assinado , solicitando à Senhora Ministra da Educação a suspensão imediata da aplicação da TLEBS. Gente que se vê estar do lado do bom-senso, contra a inovação pela inovação. A seguir se apresenta o texto da petição e os nomes que encimam o abaixo-assinado:

“Exma Senhora Ministra da Educação,

Os abaixo-assinados vêm expressar a Vossa Excelência a sua muita preocupação com as consequências negativas que advirão da colocação em funcionamento da anteriormente aprovada Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário (TLEBS). Essa terminologia foi proposta em termos de parcialidade científica e disciplinar, à margem dos especialistas interessados na preservação da Língua como património comunicacional e estético de índole pragmática e criativa, sem discussão pública alargada e, por isso, não permitindo a responsáveis das áreas competentes e a cidadãos em geral medir devidamente os resultados das alterações introduzidas e pronunciarem-se.
Os signatários vêm deste modo solicitar a Vossa Excelência se digne proceder à suspensão imediata da aplicação desse documento e proceder à sua reconsideração, de modo a facultar o debate com vários tipos de especialistas, evitando o tipo de ensino do Português que nele se propõe, de terminologia incorrecta e abstrusa, inadaptável a certos níveis etários e ocasionadora de graves dificuldades de aprendizagem, molestação da Língua, formação de deficientes modelos de pensamento, além do apreciável aumento de custos do material escolar, por tudo isto atingindo também outras disciplinas curriculares, com gravíssimas consequências para o nosso país.” Assinam:

Jorge Morais Barbosa – Professor Catedrático de Linguística, U. Coimbra, Decano dos Linguistas em exercício na Universidade Portuguesa
Maria Alzira Seixo – Professora Catedrática de Literatura, U. Lisboa; Presidente da Federação Internacional de Línguas e Literaturas Modernas, 1999-02
Vasco Graça Moura – Escritor; Prémio Pessoa
Helena Carvalhão Buescu – Professora Catedrática de Literatura, U. Lisboa
Eduardo Prado Coelho – Professor Associado de Literatura, U. Nova; Ensaísta
Maria do Carmo Vieira – Prof.ª do Ensino Secundário, Esc. Marquês de Pombal
Manuel Gusmão – Professor Catedrático de Teoria da Literatura, U. Lisboa
Maria Alice Gomes da Costa – Prof.ª do Ensino Secundário, Esc. D. Pedro V
José Saramago – Escritor, Prémio Nobel de Literatura
Lisboa, 20 de Novembro de 2006”

Apela-se, a todos os que se revêem nesta solicitação, nomeadamente professores de Português mas também de outras disciplinas, e outros cidadãos não professores, para que assinem em folha própria disponível na sede deste jornal.

Após preenchidos os abaixo-assinados, enviar para: Escola Secundária D. Pedro V
Ao c/ de Drª Maria Alice Costa
Estrada das Laranjeiras, 122
1600-136 LISBOA
Se preferir, pode subscrever o documento através de e-mail, para o endereço: tlebs.300@gmail.com

Pode, ainda, consultar os endereços: http://fgc.math.ist.utl.pt/tlebs.jpg e http://fgc.math.ist.pt/tlebs.pdf

Muito gostaria o responsável por este espaço do jornal que os leitores se postassem do lado da sensatez, como as grandes figuras que encimam esta petição.

TLEBS - 5

O nome substantivo e a inovação complicativa




A gente sabe que a moderna linguística, por via e ao nível da investigação, descobriu fenómenos linguísticos que dão lugar a conceitos que têm, portanto, de ser nomeados com novas palavras que lhes correspondam. Mas também sabemos que não deve ser do pé para a mão que devam substituir, em sede de terminologia destinada aos ensinos básico e secundário , esses neologismos, de vocábulo ou de mera acepção. E muito mais, se eles possam ser (ou parecer) desnecessários ou inúteis, e até de certo modo perturbadores do ensino/apredizagem da gramática da língua.
Parece-nos que a nova TLEBS, em vez de facilitar, só virá complicar o processo. E é por isso, mas nem só por isso, que estamos contra ela. Até pelo processo como ela foi, afinal, elaborada e mesmo oficializada por meio de portaria, já publicada no Diário da República, sabemos agora que na vigência do governo de Santana Lopes. Para que ninguém possa dizer que estamos para aqui a falar de cor, a falar por falar, vamos apresentar, comparativamente a classificação de nomes substantivos, tendo em vista as gramáticas com mais de meio século de uso entre nós e por exemplo a Grammaire du Français Contemporain, Larousse, 100ª edição, de 1997, da responsabilidade autoral de cinco professores universitários, certamente bem escolhidos pela Larousse.
Tomemos, por exemplo, a palavras: cão (chien), justiça (justice), multidão (foule)..
Segundo Elementos de Gramática Portuguesa, de Adriano A.Gomes,11ª edição, (sem data, ou a página em que tinha a data, rasgou-se..., mas deve ser dos anos finais da década de 30 , iniciais de 40, pois se trata da minha primeira gramática no ensino secundário). De notar que a edição apresenta um parêntesis em que se afirma “(profundamente modificada)”. Vejam então. Primeiro Adriano Gomes, a seguir Celso Cunha.
- cão – (nome) substantivo, concreto, masculino singular.
- justiça – (nome) substantivo, comum, abstracto, feminino singular
- multidão - (nome) substantivo colectivo, feminino singular
- cão – substantivo comum, concreto, masculino singular
- justiça – substantivo comum, abstracto, feminino singular
- multidão – substantivo comum, colectivo, feminino singular
Por aqui se vê que, no essencial, a mesma classificação atravessou todas estas décadas (mais de 50 anos), de gramática em gramática até à Nova Gramática do Português Contemporâneo, de Celso Cunha / Lindley Cintra, 3ª edição Sá da Costa – 1986. Agora segundo a nova TLEBS:
- cão – nome comum, contável, animado e não humano, masc. singular (contável e não contável, até o meu computador rejeita!...).
- justiça – nome comum, não contável e não humano, fem. singular
- multidão – nome comum, contável, animado, humano , fem. singular
Agora pergunto eu, justificando os adjectivos ‘desnecessários, inúteis e até perturbadores’ que acima emprego, tendo em vista a classificação ‘contável/incontável, animado/inanimado, humano/não humano’ (não viria aqui a calhar desumano?...): tem alguma pertinência, na classificação do substantivo, acrescentar estes adjectivos? Até porque eles invadem áreas disciplinares/curriculares que os alunos aprendem pragmaticamente (ou já conhecem de outras disciplinas: matemática, ciências naturais, etc.!). Acham que vale a pena estar a complicar quando se trata de classificar gramaticalmente um substantivo?...
Por falar em substantivo e a título de curiosidade, peço aos senhores responsáveis desta TLEBS, que se dêem ao trabalho de consultar as gramáticas do Francês, actuais, para verem se eles ‘exterminaram’ da terminologia gramatical, o substantivo. Para eles, le nom continua a ser le nom substantif et le nom adjectif. E, para tanto, baseiam-se, não numa tradição de décadas ou mesmo de séculos, mas numa tradição mais que milenar: nomen substantivum e nomem adjectivum dos gramáticos latinos (Ver a entrada ‘Substantivo, Gram.’, da Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira). Depois, pouco se importam com a distinção entre concreto e abstracto e mesmo colectivo, mas realçando a rubrica ‘noms propres’. Pelo que, se eu quisesse classificar os substantivos acima indicados, segundo a referida Grammaire du français contemporain, teria de ser como noms substantifs non propres.
Já agora façamos o mesmo exercicio com a palavra seguinte:
- possivelmente – segundo as gramáticas portuguesas acima referidas: advérbio de modo; segundo a nova TLEBS: advérbio disjunto modal. E a mim, só me resta perguntar, ao diácono, xe havia mesmo nexexidade?... E dizer ainda que, para os falantes do Francês, ‘possiblement’ continua a ser simplesmente un adverbe de manière e, para os espanhóis, embora a Gramática Básica del Espanhol, SGEL, 10ª edição 2001, se tenha deixado levar, na classificação do nombre substantivo, com a tal... ‘desnecessidade’ - “animado/inanimado, humano/não humano, contável –, quanto ao advérbio ‘posiblemente’ , chama-lhe simplesmente adverbio de modo...
(Lembro-me bem de, na minha prática, tentar explicar aos alunos o significado, quanto possível etimológico, dos termos da terminologia gramatical. Para advérbio [ad+verb(i)um], dizia-lhes que era uma palavra que tinha como função modificar (daí chamarem-lhe alguns gramáticos modificador...) o significado de outra palavra a que se juntava, fosse verbo, adjectivo ou mesmo outro advérbio... ).

TLEBS - 4

A frase e a oração
e outras coisas que têm a ver com a tal tlebs




Uma das muitas coisas em que interfere a nova tlebs é a oração, que poderá passar a chamar-se frase (segundo DN de 28/Set/2006, p. 22). E então a frase, passará a chamar-se o quê?...
Vamos transcrever as definições de frase e oração e, já agora, também período, constantes de dicionários, enciclopédias e gramáticas (uns mais antigos outros recentíssimos...). (Atenção: sublinhados nossos).
- Grande Encicl. Portuguesa e Brasileira ( edição de muito antes de 45): “FRASE, s. f. Reunião, agregado de palavras ou de orações que apresentam um sentido completo (é o período gramatical dos gramáticos)[...]”. ORAÇÃO, s. f. [...] Sentença; [...] expressão verbal de um juízo: Aristóteles ensinou que nem toda a oração contém uma afirmação ou um juízo, mas somente aquela que expressa uma verdade ou erro, o que não acontece com todas as orações; considerada logicamente, a oração consta de dois elementos: sujeito (ver) e predicado (ver). // O mesmo que proposição. “. PERÍODO [...] Segundo o autor atrás citado [Eduardo Carlos Pereira,na sua Gramática Histórica, 8ª edição] talvez por isso “...é que Chassang, procurando interpretar a vaga ideia fornecida pelo étimo, desconhece o período simples, e define o período gramatical como uma frase composta de vários membros ou proposições, cuja reunião forma um sentido completo” [...]. Consultem dicionários e gramáticas, de há umas boas décadas a esta parte, e lá encontrarão esta definição de Chassang que se pode bem identificar pela constância de ‘reunião’ e ‘sentido completo’. Querem ver?
- Dicionário Complementar da Língua Portuguesa, Augusto Moreno (1936): “FRASE (L. phrase < Gr. phrasis), f. Reunião de palavras que forma um sentido completo; [...]. ORAÇÃO (L. oratione), s.f. Súplica religiosa; reza; discurso, sermão; fala; (gram.) proposição. PERÍODO [...] (gram.) oração ou reunião de orações que formam sentido completo”. Dicionário Complementar da Língua Portuguesa, Augusto Moreno –1936)
- Dicionário da Língua Portuguesa 2003, Porto Editora: “FRASE s.f. 1 GRAMÁTICA unidade linguística constituída por elementos organizados segundo uma ordem hierárquica, entre os quais se estabelecem relações sintácticas e semânticas”; “ORAÇÃO 4. GRAMÁTICA proposição”; PROPOSIÇÃO 5 oração ou frase gramatical” Dicionário da Língua Portuguesa 2003, Porto Editora).
Agora, de outras línguas.
- Larousse Classique (1957): “PHRASE [...] Assemblage de mots présentant un sens complet” ; “PROPOSITION [...] Gramm. Expression, énonciation d’un jugement: chaque phrase contient une ou plusieurs propositions. PÉRIODE [...] Gramm. Phrase composée de plusieurs propositions harmonieusement enchaînées”. .
- Le Petit LAROUSSE Illustré 2005 (100e ÉDITION): “PHRASE (gr. phrasis, de phrazein, expliquer ) 1. LING.Unité élémentaire d’un énoncé, formée de plusieus mots ou groupe de mots (propositions) dont la construction présente un sens complet”. PROPOSITION [...] 3. Gramm.Unité syntaxique élémentaire de la phrase, géner. construite autour d’un verbe. Proposition indépendente, principale, subordonnée”.
- Petit Robert, 1993): “PHRASE [...] 3. (XVIII e) Toute assemblage lingistique d’unités qui fait sens (mots e graphèmes grammaticaux) et que l’emetteur et le récepteur considère comme un énoncé complet; unité minimale de communication”.
A título de curiosidade, citemos Elementos de Gramática Portuguesa, por Adriano Gomes, 11ª edição (“Profundamente modificada”!), (início da década de 40). Minha primeira gramática de aprendedor do Português, no secundário, nela se reflecte, na terminologia, a influência francesa. Altura em que os gramáticos portugueses tinham passado a chamar proposiição à oração. Vejam, p. 128: “Todos os textos , seja qual for o assunto neles versado, podem dividir-se em partes, cada uma das quais corresponde a um dos pontos principais do assunto expendido. Cada uma dessas partes é dividida em parágrafos que constam de um ou mais períodos. Os períodos sendo constituídos por uma ou mais proposições, hão-de formar sentido completo. Uma ou mais palavras com que se faz uma afirmação chama-se proposição.(Exemplos...). A uma ou mais proposições formando sentido completo dá-se o nome de período ou frase. [...] “.Mais tarde (e eu acompanhei essa alteração), de joelhos ou de pé..., voltaram a chamar oração à proposição
Podíamos continuar citando todas as gramáticas que, oficialmente, têm apoiado, de há umas boas décadas a esta parte, o ensino/aprendizagem do Português. Mas acho que bastará remeter para a Nova Gramática do Português Contemporâneo, Celso Cunha e Lindley Cintra, Ed. Sá da Costa, 3ª edição, p. 119 e seguintes.
Voltaram a chamar-lhe oração... Chamar-lhe frase, como agora pretendem (será por influência da generativa anglo-saxónica ou por outras influências não confessadas?...), a meu ver, só vai criar confusão, quiçá o caos terminológico, escusadamente! Como diria o diácono Remédios, não havia nexexidade !...

TLEBS - 3

TLEBS, dicionários e gramáticas

Num dos seus últimos programas na RTP, entre os livros que apresentou (recomendou?), o professor Marcelo mostrou-nos um novo dicionário da Verbo, sublinhando a particularidade de que se trata de um dicionário com a nova TLEBS (terminologia linguística para o ensino básico e secundário). E eu logo desabafei para os meus botões: “Eh lá, tão depressa?! Assim, já, antes que a grossa polémica acabe de estar devidamente conversada e resolvida? Se calhar ainda vai sair asneira...
E decidi-me a escrever aqui umas palavras sobre dicionários/enciclopédias da Verbo. Sabemos que é da Verbo o tão famoso como desafortunado Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da responsabilidade da Academia das Ciências de Lisboa. Famoso, porque a editora o apresentou como sendo, desde a edição, o instrumento por excelência da “normativização” (sic) da Língua Portuguesa; desaforttunado (=infeliz ), porque, como é sabido, acaba por não ser um dicionário a sério, mas antes uma vergonha de que deveria envergonhar-se a própria Academia que o patrocinou, a qual mereceu a seguinte referência por parte de José Carlos de Vasconcelos, no JL nº 940 (De 11 a 24/Out./06), p. 3, a propósito do “Encontro de Academias do Brasil e de Portugal (de 18 a 21 de Outubro): “pergunto-me se tal iniciativa servirá para transmitir algum alento à velha instituição portuguesa, que ao contrário da sua congénere do Brasil não se tem distinguido nem pelo seu dinamismo, nem pelo seu prestígio, nem pela sua influência na vida e na sociedade do país. Os membros da ACL são seguramente pessoas respeitáveis, muitas ou algumas serão mesmo muito activas, até notáveis, mas de facto a acção da nossa Academia é ou parece quase inexistente. Por outras palavras: não obstante tentativas de uma certa renovação, ou de algum rejuvenescimento, a ACL parece “morta”, enquanto a ABL surge como estuante de vida e actividade, multiplicando-se em iniciativas as mais diversas.”
Para esclarecer as razões que me levaram a “dizer mal do referido Dicionário, permito-me remeter para Tento na Língua!..., Plátano Editora, para as seguintes rubricas em que, para o bem e para o mal, se refere o dito dicionário: 84, 95, 98, 115 (1º vol.); 116, 159, 180, 183, 207, 215 (2º vol.); 311, 342 (3º vol.). Todas estas referências derivam de consulta trivial. Mas deixam-me a pensar no que se encontraria se se tratasse de uma análise aturada. Só alguns exemplos. Não regista a palavra ‘historíola’ que precisei de confirmar. Desejando confirmar a etimologia do verbo ‘mancomunar’, eis que às tantas me aparece “ = CONCLUIR” (em vez, obviamente, de ‘CONLUIAR’). Quanto a estrangeirismos, regista, por exemplo, em entradas diferentes, ‘stress’ e ‘stresse’, assim mesmo, meio aportuguesado (não seria melhor adoptar definitivamente o ‘estresse’ dos Brasileiros? Ao consultar o verbo ‘perpasssar’, verifiquei que não se deram ao trabalho de indicar quando é transitivo ou intransitivo, como faz qualquer outro, usando as abreviaturas: t., tr. ou trans. e i. ou intr. Nada disso, apenas um v. e só v. e nada mais que v., que quer dizer ‘verbo’. E, por curiosidade. fui procurar outros verbos Qual o quê?! Em todos os que verifiquei, v. e só v. e nada mais que v. Para o verbo ‘andar’, p. e., nem v.i. e tr. como alguns, ; ou v. tr. e intr. como outros; ou ainda, como o Porto Editora: A) v. intr. [...] B) v. tr.[...] C) s. m.; ou então o Aurélio que tem 19 acepções indicando cada uma com as abreviaturas da terminologia brasileira... E é então este dicionário que pretende “normativizar e acabar com as polémicas”?!...
Imagine o leitor o que eu fui levado a pensar quando vi o anúncio do novo dicionário Verbo, já com tlebs e tudo !... E, por falar em dicionários, falemos de enciclopédias. Olhem, por exemplo, a grande Enciclopédia Verbo, a antiga, claro! Lembro-me de tantas vezes ter ido de propósito às bibliotecas, só para consultar a Verbo, em que eu depositava confiança, sobretudo nas áreas clássicas. E quando, nas vésperas do milénio, publicitaram a nova “Verbo XXI”, caí na esparrela de a comprar (se a outra era boa, esta – “XXI” - haveria de ser melhor, pois então! ). Aqui vos digo: tem sido para mim uma grande decepção. Mal empregado o dinheiro que me custou! E então agora, sai o dicionário com a nova tlebs, assim com tanta precipitação, sabendo nós que, para integrar devidamente a tlebs nos dicionários, vai ser precisa, às editoras, uma trabalheira, um desperdício e a correspondente “despeseira”!... É para desconfiar...
Outra coisa, em que a tlebs me tem feito pensar maduramente e com alguma apreensão, são os manuais, especialmente as gramáticas que terão, todas, de levar uma volta com a profundidade exigida pela seriedade da coisa. E, notem bem, com o risco de, qualquer dia, terem de ser outra vez ‘reparadas’, repostas, como aconteceu as gramáticas “generativizadas” dos anos 70/80...
Haja calma, meus senhores! Calma e ponderação, porque a precipitação nunca foi boa conselheira!
E para terminar, só mais uma pergunta inocente: terão os responsáveis da tlebs contactado os responsáveis pela Língua Portuguesa no vasto Mundo Lusófono?...


TLEBS - 2

TLEBS, INOVAÇÃO E CATÁFORA
( Continuação da anterior)


Para fazermos uma ideia do espírito que terá presidido à elaboração da tal TLEBS (Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário), atentemos nas palavras ( poderíamos dizer palavrões...) que os Iluminados foram rebuscar (ao grego, é claro), para nomear conceitos que dizem ser novos. Por exemplo, catáfora e que nos dicionários menos recentes é registada como vocábulo da área da Pat. (patologia). Mas antes da catáfora, convém lembrar umas coisas, que não deviam ser nada despiciendas para os fautores da ‘reforma terminológica’.
Lembrei-me de dar uma espreitadela ao que se passa, por exemplo, na vizinha Espanha e na França. E tenho em meu poder com quê: nada menos do que a GRAMMAIRE du français contemporain – Larousse, de 5 cinco professores universitários, edição Larousse-Bordas de 1997; e GRAMÁTICA BÁSICA DEL ESPAÑOL, norma e uso, de Ramon Sarmiento e Aquilino Sanchez, SGEL, 10 ª edição 2001. Pelos vistos uma e outra usam – eu diria à exaustão (a espanhola indica isso na contracapa) – a terminologia oficial usada nas escolas, no ensino da respectiva língua. E que verificamos nós ao folheá-las com um certo vagar? Que em ambas, se mantém, geralmente, a terminologia tradicional, acrescentando, é claro, coisas que têm a ver com as últimas achegas da linguística. Como de resto se tem verificado nas melhores gramáticas de Português, entre as quais não tenho receio de mencionar: Gramática do Português Moderno, de M. José Castro Pinto / Maria do Céu Vieira Lopes, 6ª edição Plátano Fev./2005, gentilmente oferecida pelo autor; Gramática de Português, de Cármen Nunes / al., Didáctica Editora, 3ª edição 1995 (lembram-se da célebre gramática do mocho que ainda foi a que nos valeu, mantendo o equilíbrio, na tal hecatombe generativista?...); Gramática [UNIVERSAL] Língua Portuguesa, de A. Afonso Borregana, Texto Editora, 1996. E, é claro, a NOVA GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS CONTEMPORÂNEO, de Celso Cunha e Lindley Cintra.
Quanto à francesa, lá estão: ‘la proposition’ (que há muitas décadas corresponde à nossa ‘oração’ e não é substituída por ‘la phrase’), ‘les noms (nom substantif, nom adjectif’), les ‘conjonctions’, les ‘adverbes’, les ‘adjectifs qualificatifs’ et les ‘adjectifs déterminatifs’, le ‘nom propre’, ‘propositions subordonnées’ etc., etc.
Quanto à espanhola, à parte um ‘palavrão’ ou outro certamente inovado, como, p. e., chamar ‘prótasis’ à ‘oracion condicional’ e ‘apódosis’ à ‘principal’, na generalidade a terminologia tradicional mantém-se. Mas eu acho que não é de mais pedir aos Iluminados que confrontem as terminologias espanhola e francesa com a que eles nos estão agora a propor/impor. Experimentem só...
Permitam-me voltar aos tais pelo menos 210 palavrões que eles dizem terem entendido ‘inovar’. E agora sim, vamos então à catáfora.. Vejam só.
Fui a todos os dicionários que me rodeiam a mesa de trabalho, para ver se em algum a encontrava registada. (É claro que, vendo-a composta de dois elementos gregos (kata+phora), não era muito difícil encontrar o significado etimológico (que não é o caso na TLEBS!). Em metáfora só muda o prefixo ( a preposição...). Mas... e linguísticamente, o que seria uma catáfora ? Como nenhum dicionário me informava, nem os portugueses, incluindo o Dicionário das Ciências da Linguagem de º Ducrot / T. Todorov, os mais recentes e os antigos, nem os franceses, Larousse (mais antigos e o Petit de 2005), Le Petit ROBRTS (1993)...
É claro que não podia deixar de ir ao dicionário Grego-Português. Tinha de ter. E tinha mesmo. Querem ver?
“kataphorá, ãs: s.f. descida, queda, ferida profunda”.
Para maior descargo de consciência, voltei a dar uma volta aos portugueses e lembrei-me do grande dicionário (7volumes) de J. Pedro Machado que, há mais de 40 anos adquirira como sócio da Sociedade de Língua Portuguesa. E não é que registava mesmo! Mas sem qualquer acepção linguística. Assim:
“Catáfora, s.f. Letargia || primeiro grau do coma || coma imperfeito || Termo com que se designava um estado intermédio ao coma e ao estupor.” .
Para que não me acusem de sectário, fui também ao Dicionario de la Lengua Española, da Academia Real Española (1995). De todos, vejam bem, foi o único em que encontrei a palavra registada com indicação de que se trata de termo linguístico: “tipo de deixis que cumplen ciertas palabras, para anticipar por una parte aún non enunciada del discurso, que va a ser emitida a continuacion, v. gr, esto en la frase lo que digo es ESTO: que renunciaba.
Só que, tal não chegou para me convencer de que a TLEBS é boa.. E mais digo, não querendo ser profeta de desgraça: A TLEBS pode ser mais uma desgraça para o ensino/aprendizagem do Português!.

TLEBS - 1

TLEBS, INOVAÇÃO E CATÁFORA


Vai aí pela galinheira em que todos somos galos ou galinhas, uns mais galos outros mais galinhas, ou seja, por esse país tristonho e sorumbático que vai sendo o nosso, vai por aí um zuruzunzum polémico acirrado, por causa de uma coisa a que, barbaramente, deram o nome de TLEBS e que nem os que a inventaram saberão, decerto, plenamente explicá-la. Explicá-la nos seus termos e explicá-la na sua razão de ser. Ela foi lançada por uns Iluminados inovadores (parece que bem pouco iluministas) que há muito na cabeça têm ferrada a ideia de que um Instituto de Inovação foi feito, é claro, para inovar. Substituir coisas antigas por coisas novas Inovar a todo o custo, Inovar por inovar, nem que seja em pura gratuitidade. Inovar e, com o poder de galos significativos que lhes foi dado pelas galinhas da capoeira que nem sabem porquê, impor-lhes a inovação. Com o argumento, assim parece à primeira vista, de que a inovação já vale só por si, mesmo que inove – repete-se – gratuitamente: apenas novas coisas, novos conceitos, novas palavras que, além da novidade inovada, não tem pés nem cabeça por onde se lhes possa pegar, para serem devidamente arrumadas nas cabecinhas das Crianças, dos Moços e das Moças, do Básico e do Secundário.
Trata-se da tal TLEBS, pois então (Terminolgia Linguística para o Ensino Básico e Secundário).
As gramáticas de recentes edições, que tanto têm feito por se actualizarem, acrescentando, introduzindo novas achegas, linguísticas e gramaticais, que a investigação moderna em boa hora nos trouxe, desde o estruturalismo de Saussure, passando pelo generativismo de Noam Chomski, sem esquecer toda uma plêiade de grandes linguistas europeus e americanos. E algumas – diga-se em abono da verdade - fizeram-no com boa clareza e sentido didáctico ! E agora?
“Em causa está uma revisão completa dos termos gramaticais utilizados em Portugal. A TLEBS vem substituir uma nomenclatura que vigora desde 1967[...]” (DN de 28/Set./06, p. 22).
Se calhar não se lembram, esses Iluminados, da hecatombe que, pelos anos 70/80, se abateu sobre as nossas escolas, no que respeita ao ensino do Português. Pura e simplesmente fizeram varrer dos manuais tudo o que cheirasse a gramática (tradicional, claro), para os encherem daquelas célebres arborescências inspiradas no generativismo. Eu, que tive de ler obras do grande Chomsky para preparar o exame de linguística, fiquei fascinado pelas teorias que consegui assimilar – teorias linguísticas e teorias ideológicas que, estas, ainda se podem verificar nos livros desse autor que continuam a aparecer nos escaparates das livrarias. Contudo, não deixei de protestar contra essa hecatombe. E não fui só eu a protestar. O óbvio disparate de trazer as inovações das instância da investigação linguística para o ensino básico e secundário, como foi feito, acabou por ser vencido pelo bom-senso que levou editoras e autores das boas gramáticas, que tinham sido levados pela onda, a retomarem a gramática tradicional, entretanto acrescentada das achegas linguísticas consideradas oportunas.
Estamos, agora, com a tal TLEBS, numa circunstância parecida, e eu receio que, como nos anos 70/80, vamos assistir, com esta mudança, “tão ampla e complexa” da terminologia gramatical, a uma nova hecatombe, a um novo caos no ensino do Português que precisava de estabilidade, mesmo na terminologia. Não fujo à tentação de citar, do mesmo texto do DN de 28/Set, dois parágrafos em que é citado um tal pedagogo com mais de 30 anos de experiência (Álvaro Gomes, acho que professor universitário do Minho): “Sou favorável ao uso da terminologia no ensino universitário e na formação de professores. Não no ensino básico. Será muito grave. Temo que resulte daqui uma geração de alunos autistas ou quase.”
“Nenhum pediatra diz a uma criança com dores de barriga: você tem crise gástrica moxirreica. Isto é uma questão de senso comum. No entanto, crianças de seis anos podem ser confrontadas com questões como: “Explicite o valor anafórico do conector. Que benefícios é que isso vai trazer?”
Se o benévolo leitor quer chegar à ‘catáfora’ do título, tenha a bondade de ler a próxima.

JUSTIFICAÇÃO DE AUSÊNCIA

O Ínsulo está muito triste, mas fazendo muita força para estar alegre. É por causa da ausência tão demorada da navegação bloguista. Não chegavam já as doenças, senão que aconteceu entretanto a inacessibilidade ao blogue! Vejam bem! Por tudo, se pede desculpa aos possíveis navegantes e, por acaso ou adrede, deparantes com o Ínsulo. E avisa que vai meter no blogue uma série de textos, relacionados com a TLEBS, que um seu amigo tem estado a publicar em O Correio de Pombal, numa coluneta chamada 'NA PONTA LÍNGUA - II'.